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Autocertificação de Origem no Mercosul: A Modalidade ‘Faça Você Mesmo’ que Pode Custar Caro"

  • Foto do escritor: Keila Vitola Druzian
    Keila Vitola Druzian
  • 2 de abr.
  • 6 min de leitura
Autodeclaração de origem - Exportação Brasil Mercosul
Autodeclaração de origem - Exportação Brasil Mercosul

Se você é exportador e já precisou emitir um Certificado de Origem para vender seus produtos no Mercosul com benefícios tarifários, sabe que o processo nunca foi exatamente um passeio no parque. Entre regras complexas, linguagem técnica e a eterna dúvida se você preencheu tudo corretamente, era mais fácil (e seguro) deixar essa tarefa para entidades autorizadas, como a FIESP, onde, aliás, já fui a pessoa responsável por emitir esses documentos por anos.


Pois bem, o governo brasileiro decidiu simplificar as coisas (ou pelo menos tentar). Desde 1º de março de 2025, entrou em vigor a autocertificação de origem, regulamentada pela Portaria SECEX nº 373/2024 do MDIC. A ideia é bonita no papel: o exportador agora pode emitir seu próprio certificado, sem depender de terceiros, reduzindo custos e burocracia. Mas será que, na prática, isso é tão simples assim?


Vamos destrinchar o que muda, os prós, os contras e, principalmente, por que você não deveria sair por aí autocertificando tudo sem antes entender os riscos.



O Que Muda Com a Autocertificação?


Antes, para emitir um Certificado de Origem no âmbito do Mercosul, você precisava recorrer a uma entidade credenciada (como federações de indústria, associações comerciais ou Câmaras de Comércio). Agora, basta:


  1. Declarar por conta própria que seu produto cumpre as regras de origem do acordo comercial.


  2. Assumir total responsabilidade pela veracidade das informações.


  3. Torcer para não errar, porque falsa declaração pode render multas, penalidades e até a perda do benefício tarifário.


O MDIC até disponibilizou um guia de orientação (que você pode acessar aqui), mas vamos combinar: ele é mais um “boa sorte” do que um verdadeiro tutorial passo a passo.



A Ideia é Boa, Mas… Será Que Todo Exportador Está Preparado?


Não me entendam mal. Eu adoro simplificação. Menos burocracia é sempre bem-vinda. Mas, depois de anos emitindo certificados de origem e vendo de perto as dúvidas dos exportadores, tenho minhas ressalvas.


1. Os Acordos Comerciais Não São Leitura de Fim de Semana


Se você já tentou ler um acordo de preferência tarifária do Mercosul (ou qualquer outro), sabe que não é exatamente uma leitura leve. Os critérios de origem podem ser:


  • Conteúdo regional mínimo (ex.: “o produto deve ter pelo menos 60% de matéria-prima da região”).


  • Mudança de classificação tarifária (ex.: “o produto final deve ter um código NCM diferente dos insumos importados”).


  • Processo específico de produção (ex.: “deve passar por solda a arco elétrico para ser considerado originário”).


Se você não está familiarizado com esses termos, é fácil se perder. E um erro pode significar:

✔️ Seu cliente sendo taxado na importação.

✔️ Multas para sua empresa.

✔️ Problemas fiscais no país de destino.

✔️ Perda do benefício da autocertificação de 1 a 5 anos


2. O “Guia” do MDIC Não É Exatamente Um Passo a Passo


O manual disponibilizado pelo governo explica o conceito, mas não detalha como preencher o certificado, quais informações são obrigatórias ou como verificar se seu produto realmente se enquadra. Ou seja, você fica no “se vira, mas não esquece que a responsabilidade é sua”.


3. Nem Todo Produto é Óbvio


Alguns itens têm origem clara (ex.: café brasileiro exportado para a Argentina). Outros, não. Se sua empresa usa insumos importados, a análise já fica mais complexa. E o fato de você ter comprado um produto fabricado em outro país fora do acordo de uma empresa brasileira, não faz dele um produto brasileiro. ATENÇÃO! Sem uma orientação adequada, o risco de emitir uma declaração errada é alto.



Quando a Autocertificação Pode Ser Uma Boa Ideia?


Apesar dos riscos, há casos em que vale a pena:


✅ Produtos de origem claramente nacional (sem insumos importados relevantes).

✅ Exportadores experientes, que já conhecem as regras de origem do acordo.

✅ Empresas com assessoria especializada (consultores, departamento de comércio exterior bem estruturado).


Para os demais, minha sugestão é: não abandone as entidades certificadoras ainda. Elas existem por um motivo.



E Se Eu Quiser Arriscar? Dicas Para Não Fazer Feio


Se você decidir encarar a autocertificação, tome alguns cuidados:


🔹 Estude o acordo comercial aplicável ao seu produto (Mercosul, ALADI, etc.).🔹 Mapeie a origem de todos os insumos – se algum for importado, verifique se ele não invalida o critério de origem.

🔹 Documente tudo – tenha provas que sustentem sua declaração (ficha técnica, notas fiscais, processos produtivos).

🔹 Consulte um especialista antes de declarar algo que você não tem certeza.



O Que Dizem os Especialistas?


Como toda boa discussão, é importante ouvir outras vozes do setor.


Pesquisei o que entidades emissoras e especialistas em comércio exterior estão dizendo sobre a mudança – e, adivinhem? Não sou só eu que tenho ressalvas...


Posicionamento das Entidades Emissoras: Entre o Apoio e a Preocupação


1. Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP)


A FIESP, uma das maiores emissoras de certificados de origem no Brasil, reconhece que a autocertificação pode agilizar processos, mas alerta:


"A ausência de um controle prévio aumenta o risco de declarações incorretas, especialmente para empresas que não possuem expertise em regras de origem. A fiscalização a posteriori pode resultar em penalidades severas, incluindo a perda de preferências tarifárias."


Ou seja: simplifica, mas exige conhecimento técnico.


2. Confederação Nacional da Indústria (CNI)


A CNI emitiu um comunicado destacando que a medida alinha o Brasil a práticas internacionais (como o sistema de autocertificação da União Europeia), porém ressalva:


"Recomendamos que as PMEs busquem orientação antes de adotar a autocertificação, pois os acordos comerciais têm cláusulas complexas que podem passar despercebidas."


3. Câmaras de Comércio e Associações Setoriais


Entidades como a Câmara de Comércio Internacional do Brasil (ICC Brasil) e a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) temem que a falta de padronização gere insegurança jurídica:


"Sem um modelo único de documento ou validação automatizada, haverá espaço para interpretações divergentes, o que pode levar a disputas nos países de destino."



O Lado dos Especialistas Independentes


Consultorias em Comércio Exterior


Empresas como Comex do Brasil e Logcomex avaliam que:


✅ Grandes exportadores (com equipes especializadas) serão os maiores beneficiados.⚠️ PMEs podem enfrentar dificuldades, especialmente em setores com cadeias globais (ex.: autopeças, eletrônicos).


Acadêmicos e Pesquisadores


Professor Lucas Ferraz (USP), especialista em blocos econômicos, pondera:

"A autocertificação é um avanço, mas o MDIC deveria oferecer treinamentos obrigatórios ou ferramentas de verificação automatizada, como faz o México no T-MEC."



E No Mercosul? Como Estão os Outros Países?


  • Argentina: Já permite autocertificação desde 2022, mas exige registro prévio no sistema oficial.


  • Paraguai: Mantém as entidades certificadoras como opção preferencial.


  • Uruguai: Adotou um modelo híbrido, onde empresas de alto volume podem autocertificar, mas PMEs ainda dependem de câmaras de comércio.


Ou seja: nenhum país abriu mão totalmente do controle.



Conclusão: Vale a Penar Arriscar Sozinho?


A autocertificação veio para ficar, mas as entidades e especialistas concordam em um ponto:


🔹 Se você não tem expertise em regras de origem, não improvise.🔹 Use a autocertificação apenas para produtos de origem simples e documentada.🔹 Caso contrário, mantenha o suporte das entidades emissoras – pelo menos até o mercado se adaptar.


E, claro, se descobrir que seu concorrente já está autocertificando e deu tudo certo, me avise. Quero saber o segredo dele! 😉



Conclusão: Simplificação Sim, Mas Com Responsabilidade


A autocertificação é um avanço, mas exige maturidade do exportador. Se você não domina as regras de origem, pode sair mais caro do que pagar uma entidade para emitir o certificado.


E, sinceramente? Depois de ver tantas empresas errando declarações mesmo com ajuda profissional, fico imaginando o que vai acontecer quando todo mundo puder emitir por conta própria. O futuro dirá se essa mudança vai realmente facilitar a vida do exportador ou se vai virar um prato cheio para dores de cabeça fiscais.


Enquanto isso, se precisar de ajuda, já sabe onde me encontrar. 😉


Gostou da análise? Compartilhe e comente qual sua experiência com a nova regra!



Keila Vitola é especialista em comércio exterior, com experiência em certificação de origem e análise de acordos comerciais. Já emitiu mais certificados do que cafezinhos tomados em reunião de câmara setorial. Conecte-se no LinkedIn.



Fontes Consultadas:

 
 
 

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